quarta-feira, 3 de setembro de 2008

Crônica: Mundo novo

Aos amigos leitores desta página, peço que leiam e comentem está crônica de minha autoria:

As expectativas quanto à chegada do novo milênio eram as mais diversas. Algumas beiravam ao apocalíptico. Segundo certa crença popular estava escrito (não se sabe onde e por quem) que o mundo acabaria no ano dois mil. Quanta gente se martirizou! Quantas rezas, rosários, terços, ave-marias, despachos, velas de todas as cores nos mais diversos altares e para todas as divindades.Para completar o quadro de especulações e medos, eis que surge um outro motivo de pânico: o bug do milênio. Os computadores iriam zerar à meia noite do dia 31 de dezembro de 1999 e pelo menos um terço da humanidade seria banida do sistema. As máquinas iriam travar, os aviões que estivessem no piloto automático poderiam cair, as contas bancárias e tudo o mais que dependesse da memória ram dos computadores entraria em desordem. Enfim, o caos se instalaria no momento em que os primeiros fogos de artifícios pipocassem na Praia de Copa-Cabana, na Chant Elisèes, na Time Square, ou em qualquer outro lugar do mundo, de acordo com seus respectivos fusos horários.Nós que escapamos a toda àquela guerra de nervos, sabemos que tudo não passou de mais um temor infundado, alimentado conscientemente por pessoas e corporações que precisam de uma comoção social, de uma paranóia coletiva para vender livros, revistas, jornais, galgar mais um degrau de audiência ou arrebanharem novos fieis pelo temor de queimarem para sempre no lago que arde com fogo e enxofre.Foi com os olhos vidrados na televisão, os dedos cruzados e com o coração aos pinotes que muitos de nossa geração adentraram ao temido século 21. Foi uma situação parecida com aquela em que alguém estivesse na mira de uma arma, esperando uma bala entre os olhos. Borrando-se de medo e suando frio, ouve o puxado do gatilho, mas... Ufa! A arma não tinha bala na agulha.Aquele início de milênio foi igual a qualquer reveillon, não fosse o medo que pairou sobre muitas cabeças. No dia primeiro de janeiro nenhuma notícia extra na televisão, nenhuma manchete catastrófica nos jornais e nos sites. Todo mundo se olhava no espelho e se beliscava para ver se estava mesmo vivo. E não é que estamos até hoje!Mas não foi naquela noite de quinta para sexta-feira que inauguramos o século 21. A nossa estréia não foi entre champanhas estouradas e tim-tins, abraços e vivas. Foi numa terça-feira, 11 de setembro de 2001, por volta de 10 horas da manhã, pelo horário de Brasília, que perdemos toda nossa inocência. Tudo muito parecido com aquilo que nossos avós esperavam. Parecido para nós que ficamos como testemunhas vivas da História, porque para aquelas quatro mil almas que estavam no Wold Trade Center naquela fatídica data, a profecia se confirmou integralmente. O coração da Big Apple fumegava. O orgulho americano reduzido a escombros colossais e chamas que tostavam corpos humanos num espetáculo horrendo e difícil de acreditar. Tudo transmitido ao vivo para o mundo todo, através das lentes da CNN, pelos sites de notícias, únicos veículos de alcance mundial que tiveram agilidade necessária para se conectar ao fato vinte minutos após o choque do primeiro avião.Pelas mãos do terrorismo, éramos apresentados ao novo milênio, que nos trazia de presente a guerra-fria com um software novo. Até que Mikhail Gorbachev reconhecesse a derrocada do império soviético e aceitasse desarmar a sua bomba-relógio, vivíamos com medo de que ele, num dos seus porres de vodca, apertasse num botão e todos nós morrêssemos torrados pelos megatons do seu arsenal atômico.Hoje em dia, a piração é outra. Aliás, são outras. Ou melhor, são muitas.O mundo virou uma enorme orquestra desafinada, executando a partitura ditada pelo terror, naquele dia 11 de setembro. A economia mundial, as guerras e toda a geopolítica do mundo foram influenciadas pelas ordens emanadas de uma loca de pedras qualquer, situada em qualquer lugar cinzento do Oriente Médio.Enquanto você está lendo esta crônica uma bomba pode explodir num arranha-céu, numa estação de metrô ou em qualquer outro local chique do mundo civilizado. Se é que existe capitalismo com este adjetivo.Se você ligar a televisão daqui a pouco e algo parecido tiver acontecido, cuide logo de proteger seus trocados, porque o barril de petróleo vai ficar mais caro, o real vai se desvalorizar frente ao dólar e você talvez não possa mais comprar aquela muamba que viria do Paraguai, cotada pela moeda do Tio Sam.
(F.CARVALHO)

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